domingo, outubro 05, 2003

Sua excelência exagera
O senhor Presidente da República vem-se multiplicando em declarações sobre o estado da Justiça. Jorge Sampaio, quanto a mim, exagera.
Por várias razões, a saber:
Não é de hoje que a Justiça está no estado em que está. A Justiça e, diga-se, outros sectores que vêm, igualmente, merecendo a presidencial atenção. Não é de hoje que o Ministério Público/Procuradoria-geral da República têm os poderes que têm. No passado, todavia, o Presidente da República manteve-se calado ou, eventualmente, falou demasiado baixo, o que dá no mesmo.
Vir agora falar sobre direitos dos arguidos, ou dos detidos preventivamente se não é o mesmo, soa a dor relativamente aos “poderosos” presos. Vir agora falar disso, e com a insistência com que Jorge Sampaio o faz parece mal e dá para desconfiar.
O cidadão Jorge Sampaio partilhou o escritório de advocacia com dois ex-ministros socialistas da Justiça: Vera Jardim e António Costa. Nesses tempos, manteve-se calado enquanto o anterior Procurador-geral da República concentrava poderes e somava polémicas.
O Presidente da República esteve calado durante todos os dias em que cidadãos comuns foram vítimas da mesma Justiça que agora está tão na ordem do dia: os advogados eram os mesmos, os juízes idem, os investigadores idem idem.
Parece mal, parece-me muito mal, que o Presidente da República tenha começado a falar quando foi detido alguém da sua família política. Também por isso, Jorge Sampaio devia ser mais, digamos, prudente.
Não porque as razões não sejam boas. Desconfio que são, até, muito boas. Mas, insisto, esta Justiça existe assim há muitos anos e de Sampaio não se ouviu uma palavra. Agora parece mal.
Já agora, de Jorge Sampaio - e sobre este mesmo tema - esperar-se-ia uma tomada de posição de alerta contra a mais recente proposta do bastonário da Ordem dos Advogados: Júdice defendeu publica e implicitamente o reforço dos poderes da Judiciária e do Ministério Público.
Iremos de mal a pior e, aqui, sim, era desejável uma palavra, uma frase, um discurso, do Presidente da República.

Sem comentários: