quarta-feira, outubro 08, 2003

La passionaria
A cena, há horas, da chegada de Paulo Pedroso ao Palácio de S. Bento fez-me lembrar a história de Dolores Ibarruri, deputada comunista que fugiu de Espanha em 1939 - quando Franco conquistou o poder - e ficou conhecida como "La Passionaria".
É verdade que Pedroso não voltou do exílio, nem tem idade que lhe permita ter lutado contra a ditadura de antes do 25 de Abril de 1974. Mas foi isso que primeiro me veio à ideia.
Todavia, provavelmente, o momento terá sido mais parecido com a chegada de Mário Soares a Santa Apolónia ou de Álvaro Cunhal à Portela, nos dias imediatos à "Revolução dos cravos". Pedroso -rodeado por todos, abraçado por todos, beijado por todas, fotografado e filmado de todos os ângulos, cercado de microfones - parecia o “salvador”.
A cena foi, claramente, excessiva, mesmo para um partido que perdeu o rumo com a sua detenção. Em boa verdade, aquele fim de tarde em S. Bento revelou um Ferro Rodrigues mais parecido com um mestre de cerimónias e um Paulo Pedroso líder do PS. Lá está: o "desejado" que volta, embora não no meio do nevoeiro.
Diverti-me a observar o afã com que todos queriam abraçar, beijar, saudar, ao menos encostar-se a Pedroso. Como me diverti ao ver o abraço frio trocado com Osvaldo Castro (coisas...).
Mas também me escandalizei.
Que diabo de cena foi aquela de um cidadão comum (Paulo Pedroso, é bom não esquecer, tem o mandato de deputado suspenso) entrar pelo Parlamento pela "porta de serviço", rodeado de amigos e jornalistas, sem que se vislumbrasse um pouco que fosse da segurança obrigatória do outro lado do edifício?
Que diabo de cena foi aquela de o mesmo cidadão comum – e o seu advogado - dar uma conferência de imprensa na sede do poder democrático português?
Que diabo de cena foi aquela de um partido inteiro receber em glória um seu militante e dirigente que apenas - sublinhe-se o apenas - viu ser alterada a medida de coacção de liberdade a que foi sujeito por ser arguido num processo penal?

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