segunda-feira, outubro 27, 2003

Grandes líderes
Já tínhamos o “estou-me cagando para o segredo de justiça” e agora, li há minutos no “Público”, temos o “quero que o Roger se f...”.
A coisa está a melhorar, com a vantagem de esta última declaração não ser conhecida na sequência de qualquer escuta telefónica.
Sábado, o presidente do Benfica parace que não gostou da pergunta de um jornalista (um jornalista de desporto a fazer uma pergunta incómoda só por si devia ser notícia...) e respondeu como se lê acima.
Assim é que é! Creio mesmo que aquelas duas figuras públicas – respectivamente Ferro Rodrigues e Manuel Vilarinho – estão no caminho certo. Já não vale a pena disfarçar: as nossas "figuras" são de facto o espelho do país.
Falam como o povo, nas esperança de que assim o povo os perceba...
Vilarinho deixa de ser presidente do Benfica dentro de uma semana, mais dia menos dia. E Ferro?
É bem feito
Soube só hoje (vejam como sou distraído...) que Sª Exª o primeiro-ministro foi apupado na inauguração do campo de futebol do Benfica.
É bem feito.
Em primeiro lugar, ninguém manda os políticos continuaram a misturar-se com o futebol.
Em segundo lugar, e mais importante, é bem feito porque Durão comprovou a justeza do "Roma não paga a traidores".
Durão, é bom não esquecer, é o primeiro-ministro de um Governo que tem (ou teve) como secretário de Estado no Ministério das Finanças um tipo que negociou em nome do Benfica as dívidas do clube ao fisco e Segurança Social. Durão é o mesmo presidente do PSD que, enquanto candidato a PM, não hesitou em se sentar à mesa com Vilarinho numa qualquer acção de campanha e ouvir este dizer que ali estava para resolver os problemas do Benfica.
Que, recordemos, foram aparentemente "resolvidos" de uma maneira (ou de várias maneiras) no mínimo bizarra.
Muitos portugueses (eu incluído) pensaram, então, que Durão estava a trair os interesses do País.
Sábado percebeu que essas coisas não se pagam. E como se deve ter lembrado das semelhanças entre o redondel de um campo de futebol e o circo romano...
E não se pode demiti-lo? Ou, ao menos, calá-lo?
O senhor bastonário da Ordem dos Advogados parece muito mais uma “picareta falante” que o ex-PM António Guterres. Não sei se se lembram que era este o seu “petit nom” enquanto apenas secretário-geral do PS: tinha opinião sobre tudo, bastava-lhe um microfone à frente para começar a debitar.
José Miguel Júdice está pior. Muito pior. Doentiamente pior. Oportunisticamente pior.
O bastonário da AO tomou posse em Janeiro de 2002, e tanto quanto me lembro entrou relativamente “de fininho”, propondo muita coisa mas, fundamentalmente, falando para dentro da Ordem (ler aqui).
Entretanto, tudo mudou. Onde propunha um “congresso da Justiça”, onde deviam caber todos os seus agentes, agora guerreia tudo e todos. E, durante mais de uma ano, andou calado quanto à denúncia dos abusos e da não garantia dos direitos dos cidadãos perante a Justiça.
De repente, Júdice assestou baterias sobre tudo o que mexesse. Ministério Público, juízes, etc, etc. Não há dia em que não haja uma declaração de Sª. Exª.
A semana passada – por muito que agora o negue – pediu a demissão do Procurador Geral da República. Agora escreve-lhe uma carta aberta (ler aqui), onde desanca o responsável pela investigação do caso Casa Pia.
Tenho uma vaga ideia de que, entre tantas escutas telefónicas, há uma ou mais que o envolve. Tenho ideia de que foi publicado (e não desmentido) que Júdice falou com António Costa sobre a situação de Paulo Pedroso.
Júdice devia ter vergonha, calar-se ou demitir-se. Os advogados deviam ter vergonha, mandá-lo calar ou ajudá-lo a demitir-se.

domingo, outubro 26, 2003

Para memória futura
Desculpem, eu sei que não se deve fazer isto, mas sei também que as edições anteriores do "Público" desaparecem e este texto merece ser guardado.

Segredo de quê?
A culpa é do sistema. Em Maio, o bastonário da Ordem dos Advogados e dirigentes do PS discutiram documentos em segredo de justiça. O bastonário não considerou que tal colidisse com o seu cargo e os dirigentes do PS também não. Em Outubro, o mesmo bastonário sugeriu que se pusesse termo ao procurador-geral da República porque este não põe termo às fugas ao segredo de justiça. No mesmo mês de Outubro, o PS considera também que as fugas ao segredo de justiça visam destruir os dirigentes daquele partido.
Ou seja, em Maio, para evitar a prisão de Paulo Pedroso, a direcção do PS procurou tirar benefício das violações do segredo de justiça. Em Outubro, a mesma direcção considera que as violações do segredo de justiça fazem parte da cabala, maquinação, urdidura, campanha... contra o PS e clama contra as violações contra o segredo de justiça. Afinal, em que ficamos?
Quer o bastonário da Ordem dos Advogados quer a direcção do PS reagiram à divulgação das transcrições das escutas telefónicas como um bando de miúdos que tivessem conseguido entrar fora de horas num supermercado para provar umas guloseimas. Uma vez descobertos, fazem tábua rasa do acto que praticaram, proclamam-se vítimas e acusam o segurança de ter adormecido e não os ter visto entrar. O que foram lá fazer? Isso agora não interessa nada. E já agora como é que os senhores souberam que nós lá entrámos?
O que chocou os portugueses na transcrição das escutas não foi ouvirem Ferro Rodrigues dizer que se estava "cagando para o segredo de justiça". Aliás é a única coisa de mais genuíno que ali se entende. Porque o que chocou os portugueses foi precisamente não os perceberem indignados com o que lhes estava a acontecer. Teria sido humano que aqueles homens gritassem ir dar uma sova no procurador ou em quem tivesse inventado tudo aquilo. Mas nada disso se ouviu. Apenas combinações de contactos. O que chocou foi não haver emoção mas sim esquemas.
De mau a piau. A velha boca dos anarquistas nos anos 70 ainda deve ser a melhor definição para as violações do segredo de justiça em Portugal. O segredo de justiça está, neste momento, em Portugal, ao nível das licenças de isqueiro. Ninguém as tirava, mas toda a gente sabia que existiam. E algum agente de autoridade, em dia de azedume, podia perguntar por ela ao primeiro fumador que lhe aparecesse.
A justiça tem de adequar vários dos seus funcionamentos e linguagem ao tempo em que estamos. O caso do segredo de justiça é claramente um deles. Dada a rapidez das comunicações e a própria evolução dos "media", o segredo de justiça acaba a funcionar de forma perversa. Ou seja, em vez de defender o nome das pessoas que estão a ser investigadas, leva a que se multipliquem as mais variadas e, por vezes, derazoadas teses sobre essa investigação. Não percebo em que possa perturbar a investigação a publicação pelo jornal "24 Horas" do acórdão da Relação. Li-o todo e após a sua leitura só posso concluir que seria bom que o outro acórdão da Relação também tivesse sido divulgado na íntegra em vez de cirurgicamente seccionado.
Não ponho em causa a necessidade de existir segredo de justiça. Mas outra coisa bem diversa é esta concepção quase casular do segredo de justiça. Como algo que preserva os diferentes agentes da justiça do contacto com a sociedade até ao derradeiro momento em que majestaticamente julga ou manda arquivar.
Por fim, sublinhe-se que segredo de justiça quer dizer isso mesmo: segredo a que estão obrigados os agentes da justiça, sejam eles advogados, juízes, procuradores... Os jornalistas não têm de zelar pelo cumprimento do segredo de justiça pela mesma razão que os advogados, os arguidos, os procuradores e os juízes não vêm escrever notícias. Aos jornalistas cabe zelar pelo direito a informar.
O circo mediático. Em primeiro lugar, há que recordar que tudo começou com uma investigação jornalística. Mais precisamente com um trabalho assinado por Felícia Cabrita. Nos primeiros dias, não faltaram elogios ao trabalho desta jornalista e dos outros que se passaram a debruçar sobre o caso. Mas, passada a fase da estupefacção e do horror perante o que acontecera àquelas crianças, começou a insinuar-se que a investigação, afinal, também não era tanta. Tudo provinha de fugas de informação. E os outros jornalistas partem de manhã a correr o país em busca de informações sobre os crimes, as falências, as OPV...? Muitas das notícias, muitas vezes as mais importantes, nascem de fugas de informações. O caso Watergate, por exemplo!
Por fim, chegámos à fase do circo mediático. Do "há que pôr um travão a isto". Entendendo-se por "isto" o interesse dos jornalistas por determinados factos. Como se os envolvidos quisessem acreditar que se esvairia o problema caso aquele magote de microfones e câmaras lhes desaparecesse da frente.
Não deixa de ser curiosa esta concepção dos jornalistas como alguém que perturba, incomoda, atrapalha o que devia ser o curso natural do trabalho dos especialistas, sejam eles juízes, procuradores, advogados, líderes partidários, governos... Concede-se que os jornalistas descubram umas coisas mas, em seguida, pede-se-lhes que se retirem porque chegou a hora de trabalhar a sério no problema. A este título é exemplar o pedido do advogado João Nabais aos jornalistas para que não perturbassem com perguntas o seu cliente. Considerava mesmo este advogado que o teor das respostas dadas por Hugo Marçal a alguns jornalistas havia contribuído para que este tivesse sido detido preventivamente. Agora que Hugo Marçal era posto em liberdade, João Nabais apelava aos jornalistas para que não lhe fizessem entrevistas. Não é aos jornalistas que cabe avaliar se o conteúdo das respostas de Hugo Marçal se adequa ou não à estratégia da defesa ou da acusação. O que pensará do papel dos jornalistas um advogado que lhes pede à porta dum tribunal para não fazerem perguntas ao seu cliente para não o prejudicarem? O que achará que é o papel deles? Perguntam quando dá jeito e ficam calados depois?...
Convém que se sublinhe que o circo mediático faz vítimas. Geralmente estas vítimas são aquelas mesmas pessoas que muito partido souberam tirar do imediatismo dos jornalistas e da sua ansiedade por uma notícia. Sendo certo que, antes de o dito circo mediático se ter instalado à volta do caso Casa Pia, juízes, procuradores, advogados, líderes partidários, governos... nada fizeram por aquelas crianças. O "circo mediático" tem contribuído decisivamente para que o mundo em que vivemos seja melhor e mais justo. Pensem como seria este caso sem os jornalistas à porta das prisões para ouvir a opinião dos familiares. Sem os jornalistas para ouvir os advogados de defesa. Sem os jornalistas para ouvir as vítimas. Quer se goste quer não, o circo mediático contribuiu decisivamente para mudar para melhor a vida das crianças da Casa Pia. Tal como serviu para libertar Dreyfus, em França. Tal como serviu para desencadear o caso Watergate. Depor Collor de Melo no Brasil...
Helena Matos, in “Público”, 25/10/2003

sexta-feira, outubro 24, 2003

Que parte?
O "Daily Mirror" (creio que é este) anda a publicar mais umas supostas cartas de Diana Spencer, mais conhecida por Lady Di.
Hoje, ao passar os olhos pelo "Correio da Manhã", li que numa dessas cartas ela confessava que uma parte dela ainda gostava de Carlos.
Francamente! Qual seria a "parte"?
Quando é o congresso?
Ferro Rodrigues saiu "reforçado" da reunião de ontem da Comissão Política do PS. Uma abstenção e três votos contra (não; nenhum foi do MM Carrilho!) provam que os socialistas estão com o seu secretário-geral...
Não estão. Normalmente quanto maior é a maioria mais depressa acontece a "surpresa". Francisco Pinto Balsemão (e Mota Pinto se fosse vivo) pode explicar isso tintim por tintrim.
Os figurões do PS "disseram" apenas que não é o tempo de fazer cair Ferro. É hipocrisia em estado puro, mas como diria o ex-PM é a vida.
O PS vai fazer um congresso extraordinário; falta só saber quando é que os barões se arrumam e descobrem um momento favorável: a isto chama-se, na política, "contar espingardas".
A propósito: fabuloso o título de "O Independente" de hoje (lido apenas na montra, que é pasquim que não consumo). Para quem não viu: "Naufrágio ao largo do Rato".

domingo, outubro 19, 2003

Será?
Aqui há anos, num qualquer congresso do PSD, o inefável Alberto João desabafou para um microfone supostamente fechado que parecia que estava tudo grosso...
Desculpem a comparação, mas parece que é verdade. Olhamos à volta, blogs incluídos, e que vemos? Tudo à cabeçada, declarações cada uma mais disparatada que a anterior, um cenário "de crise" que ultrapassa em muito uma "simples" dificuldade de equilíbrio económico e financeiro.
Desde o "pequeno" caso do helicóptero de Lamego à polícia municipal do Porto, passando por acórdãos divergentes da Relação sobre o mesmo detido, a confusão é completa: há seis meses que o País parou, grudado à força no "caso Casa Pia".
Desde sexta-feira que a situação piorou e parece, agora, que nada salva o segundo maior partido, o garante da alternativa, logo da democracia.
É evidente que a coisa é muito grave e que as pessoas que o dirigem - precisamente porque são pessoas - devem andar meias desorientadas. É evidente que é impensável ouvir o "primeiro-ministro sombra" dizer que se está cagando para o segredo de justiça.
A situação é grave, gravíssima: como é possível que continue a fuga de gravações telefónicas para a rua? De onde vêm? Claro que só podem vir de um sítio. E claro que o chefe desse sítio só pode demitir-se. Ontem se possível...
Esta é a questão de princípio que se deve colocar: como é possível que o Procurador-Geral da República continue a ser o mesmo?
Mas há outras questões. São verdadeiras as transcrições que vieram a público? E não acontece nada aos intervenientes, que claramente tentaram mover céus e terra em favor de um amigo? E Jorge Sampaio? Agora não tem nada a dizer?
Portugal, a sociedade portuguesa, está doente. Muito doente. A sério: um país não aguenta tanta exposição a este desenrolar de insanidades. Até há relativamente pouco tempo, eram os políticos que tinham má fama. Era o futebol que era apontado como sede de tráfico de influências e outras maldades.
Hoje, que pensará o português médio de tudo isto? Com as condições de vida a agravarem-se, com o desemprego a crescer, pode pensar-se o quê? Que Alberto João tem razão?

quarta-feira, outubro 15, 2003

Uma manhã no tribunal
Um qualquer tribunal português. Quarta-feira, 9:30 horas (da manhã... sublinhe-se). Hora marcada para um julgamento em que este vosso criado é testemunha.
Falta à primeira chamada, mas presença na segunda. Quase toda a gente presente. Espera.
Meia hora (mais ou menos) depois, o "povo" é chamado (em magote...) para a sala de audiências. Grande e quase vazia. Lá em cima, o senhor doutor juiz. De ambos os lados, defesa e acusação. Ao meio, o réu. Atrás, sentados nos lugares do público, testemunhas pró e contra. Lá fora, o burburinho que caracteriza qualquer lugar público.
No sala começa um estranho "triálogo" entre as partes: defesa, acusação e juiz, não necessariamente por esta ordem. Cá "em baixo", porém, nada se percebe. Mas ali ficamos, estupidamente incómodos em bancos de madeira, sem ouvir nada do que é dito, portanto sem perceber o que se passa... simplesmente à espera.
Passa-se uma hora (mais coisa menos coisa). Percebemos que os protagonistas - juiz, acusação e defesa -, ditam palavras que uma funcionária escreve à mão (parece que o computador estava avariado).
No fim daquilo tudo, somos convidados a sair. À porta da sala, a mesma pessoa que tinha feito a chamada, comunica-nos que o julgamento fora adiado.
Alguns de nós voltaremos daqui a três semanas. Outros daqui a um mês.
Nunca tinha estado numa situação semelhante. Aliás, nunca tinha acompanhado o início de um julgamento. Durante aquela hora e meia de seca, perguntei-me muitas vezes se é "isto" a Justiça: se é justo incomodar um conjunto de pessoas, intimá-las a comparecer numa determinada hora de um determinado dia, para depois serem sujeitas do "jogo" dos advogados e, pior do que isso, serem actores involuntários de um conjunto de procedimentos pouco menos que idiotas.
Se uma das partes pretende adiar o julgamento, por que não é obrigada a tentar isso antes do dia marcado, por forma a não incomodar terceiros?
Se somos obrigados a estar ali, por que não temos o direito de ouvir o que se passa?
É transparente uma Justiça que os cidadãos não ouvem?
Para aque serve a fantochada dos julgamentos à porta aberta, se o sistema de som instalado não é posto em funcionamento?

domingo, outubro 12, 2003

Inenarrável
Ouvi há pouco, creio que na RTP, a gravação de um discurso de Ana Gomes algures no Alentejo e presumo que numa iniciativa do PS.
A ilustre senhora perorava, como não podia deixar de ser, sobre o caso da pedofilia. E deixava acusações graves relativamente a dois ministros, para concluir que não é o PS que está a politizar a Justiça.
Ouve-se, e lê-se, e não se acredita. A senhora saberá o que anda a fazer? E ninguém vai reagir? O senhor Presidente da República, que tanto tem falado sobre a Justiça, não quererá falar sobre o que os políticos (alguns) andam a fazer e a dizer?
Percebe-se que o PS tenha passado da depressão profunda à euforia incontrolável, mas isso admite-se, digamos, nas "bases". Aos dirigentes exige-se outro comportamento.
A não ser... A não ser que saibam muito bem o que andam a fazer. Desconfio bem que sabem: sabem que o afastamento do juiz Rui Teixeira está aí ao virar da esquina que o processo não vai dar em nada.
Detesto o discurso do desgraçadinho, mas francamente penso que Portugal caminha apressadamente para uma crise de efeitos incalculáveis.
Criámos uma sociedade sem valores, sem referências, onde os programas de Português consagram o "Big Brother", o Português Suave desaparece porque os eurocratas querem, os espanhóis vêm pescar tudo o que pretendem, os ministros metem cunhas uns aos outros, as oposições gritam mas não pensam...

sexta-feira, outubro 10, 2003

Novo contador
A contabilidade não é muito importante para o fim em vista, mas fica bem.
Depois de alguns ensaios, creio ter escolhido o contador definitivo: Bravenet.
Um outro, mais antigo, continua a correr nos bastidores.
E este post é só para experimentar algumas outras funcionalidades não imediatamente evidentes. Desculpem...

quinta-feira, outubro 09, 2003

Pedroso absolvido
Vinte e quatro horas após a libertação de Paulo Pedroso, fica claro o objectivo que norteou os socialistas na "manif" de ontem.
De facto, e como já foi sublinhado por aqui pelos blogs, será normal que um indivíduo depois de quatro meses e meio de prisão não vá a correr ao encontro da família?
Pois foi: Paulo Pedroso dirigiu-se de imediato à Assembleia da República - e não colhe aquela de que "foi aqui que o vieram buscar é aqui que ele regressa" - e ainda passou pela sede do PS antes de ir ter com os familiares.
Aquela alegria toda, é bom que fique claro, é absolutamente natural entre amigos. Tanto mais quanto, mesmo que apliquemos apenas o princípio do Direito - "qualquer indivíduo é presumível inocente" -, os seus camaradas põe as mãos no fogo por ele.
O que já não é normal é toda aquela encenação e o conjunto, alargado, de afirmações que tentam induzir a absolvição de quem continua arguido de um processo-crime. Aquilo pareceu-se de mais com uma forma de pressão. Aquilo pareceu-se de mais com uma atitude revanchista: estão a ver? Nós é que sabemos!
Em tempo de todas as citações, fica aqui mais uma: "à mulher de César não basta...". Para dizer que é bom não esquecer que o irmão de Paulo Pedroso era membro do Conselho Superior de Magistratura. Para dizer que o senhor Presidente da República tem falado de mais sobre Justiça, prisão preventiva, poderes de investigação e direitos dos suspeitos/arguidos.
É de mais. Permito-me citar aqui a conclusão de um inquérito de rua que a SIC acabou de emitir (sabendo que os inquéritos de rua valem pouco...): a maioria das opiniões transmitidas critica o "arraial" socialista de ontem.
Ainda um parágrafo sobre o deputado Jorge Lacão, socialista e presidente da Comissão Parlamentar de Ética: percebe-se que o socialista esteja muito satisfeito com a libertação do seu camarada; entende-se que o deputado não o esconda; é incompreensível que o presidente da Comissão Parlamentar de Ética tenha ido buscar Paulo Pedroso à cadeia e tenha dito o que disse à saída da reunião da Comissão a que preside.
É a cereja no cimo do bolo: o PS julga que já ganhou. E fez pior por Paulo Pedroso do que a suspeita que sobre ele recai. A juntar a esta, agora soma-se a de ter feito a Justiça funcionar a seu favor porque é "poderoso".
Não havia necessidade...

quarta-feira, outubro 08, 2003

Bora lá, que vale a pena
Sem mais palavras, sigam para as "Terras do nunca"
Por uma vez
A SIC e a RTP foram completamente cilindradas pela TVI na cobertura da chegada de Paulo Pedroso ao Palácio de S. Bento. Foi penoso ver os jornalistas daquelas duas televisões a falarem do boneco e para o boneco enquanto os seus colegas perseguiam Pedroso com perguntas e mostravam a "nomenclatura" socialista a encostar-se ao "desejado".
Minutos depois, já as tv's estavam em igualdade de circunstâncias e fiquei-me pela SIC. Deixemos os excessos destas ocasiões - os apertos, as perguntas sucessivas, a duração dos directos - para elogiar uma jornalista que reputo de antipática, pedante e outras "qualidades" similares.
Anabela Neves - que se deve ter em grande conta enquanto jornalista política e parlamentar - deu uma lição de como lidar com aquele assunto. Em primeiro lugar sublinhando que o processo não acabou; em segundo lugar confrontando alguns socialistas - nomeadamente Almeida Santos - com isso mesmo; em terceiro lugar destacando algum "excesso" da festa socialista; em último lugar, sabendo fazer ao advogado de Paulo Pedroso as perguntas que, de facto, interessavam ao público.
Por uma vez, que me lembre, a jornalista merece ser elogiada.
La passionaria
A cena, há horas, da chegada de Paulo Pedroso ao Palácio de S. Bento fez-me lembrar a história de Dolores Ibarruri, deputada comunista que fugiu de Espanha em 1939 - quando Franco conquistou o poder - e ficou conhecida como "La Passionaria".
É verdade que Pedroso não voltou do exílio, nem tem idade que lhe permita ter lutado contra a ditadura de antes do 25 de Abril de 1974. Mas foi isso que primeiro me veio à ideia.
Todavia, provavelmente, o momento terá sido mais parecido com a chegada de Mário Soares a Santa Apolónia ou de Álvaro Cunhal à Portela, nos dias imediatos à "Revolução dos cravos". Pedroso -rodeado por todos, abraçado por todos, beijado por todas, fotografado e filmado de todos os ângulos, cercado de microfones - parecia o “salvador”.
A cena foi, claramente, excessiva, mesmo para um partido que perdeu o rumo com a sua detenção. Em boa verdade, aquele fim de tarde em S. Bento revelou um Ferro Rodrigues mais parecido com um mestre de cerimónias e um Paulo Pedroso líder do PS. Lá está: o "desejado" que volta, embora não no meio do nevoeiro.
Diverti-me a observar o afã com que todos queriam abraçar, beijar, saudar, ao menos encostar-se a Pedroso. Como me diverti ao ver o abraço frio trocado com Osvaldo Castro (coisas...).
Mas também me escandalizei.
Que diabo de cena foi aquela de um cidadão comum (Paulo Pedroso, é bom não esquecer, tem o mandato de deputado suspenso) entrar pelo Parlamento pela "porta de serviço", rodeado de amigos e jornalistas, sem que se vislumbrasse um pouco que fosse da segurança obrigatória do outro lado do edifício?
Que diabo de cena foi aquela de o mesmo cidadão comum – e o seu advogado - dar uma conferência de imprensa na sede do poder democrático português?
Que diabo de cena foi aquela de um partido inteiro receber em glória um seu militante e dirigente que apenas - sublinhe-se o apenas - viu ser alterada a medida de coacção de liberdade a que foi sujeito por ser arguido num processo penal?
Que Justiça é esta?
Li, ouvi e estou a ver. O Tribunal da Relação de Lisboa mandou libertar Paulo Pedroso, com base em fundamentos deconhecidos neste momento.
Nunca se devem levantar estas questões sem afirmar, prévia e solenemente, que se acredita na Justiça. É politicamente correcto e pode dar jeito se, um dia, lá cairmos.
Mas eu não acredito. E, se fosse possível, a partir de hoje muito menos. Porque há aqui algo errado e muito grave.
Das duas uma:
* ou Paulo Pedroso não devia ter sido detido - e estaremos perante um caso de abuso de posição dominante (do juiz perante o fraco)
* ou Paulo Pedroso não devia ter sido libertado - e estaremos perante um exemplo de justiça para ricos e poderosos (os que podem recorrer a bons advogados).
A Justiça sai mal disto, tal como está - para mim - patente com esta rábula do adiamento do julgamento do tal "Bibi" e se começara a evidenciar com o adiamento do que creio chamar-se "audições para memória futura".
Se à libertação de Paulo Pedroso juntarmos a "cena" do não julgamento do "sr. Santos" de Albergaria, que violou e engravidou duas adolescentes (ou pré-adolescentes?), temos um quadro pior - muito pior - que negro.

segunda-feira, outubro 06, 2003

Muito mentirosa
Hoje acordei com uma jornalista da TSF a dizer que Maria da Graça Carvalho negara ser a próxima ministra da Ciência e Ensino Superior. A senhora, supostamente, ficou muito surpreendida com a pergunta da TSF.
Meia-dúzia de horas depois (nem tanto...) era oficial que Maria da Graça Carvalho tomaria posse como ministra da Ciência e Ensino Superior às 17 horas (ainda hoje, portanto).
Das duas... três:
1. Ou a TSF montou a notícia e mentiu;
2. Ou Durão Barroso convidou a senhora depois da notícia da TSF;
3. Ou a senhora começa muito pior que o seu antecessor saiu...

domingo, outubro 05, 2003

Sua excelência exagera
O senhor Presidente da República vem-se multiplicando em declarações sobre o estado da Justiça. Jorge Sampaio, quanto a mim, exagera.
Por várias razões, a saber:
Não é de hoje que a Justiça está no estado em que está. A Justiça e, diga-se, outros sectores que vêm, igualmente, merecendo a presidencial atenção. Não é de hoje que o Ministério Público/Procuradoria-geral da República têm os poderes que têm. No passado, todavia, o Presidente da República manteve-se calado ou, eventualmente, falou demasiado baixo, o que dá no mesmo.
Vir agora falar sobre direitos dos arguidos, ou dos detidos preventivamente se não é o mesmo, soa a dor relativamente aos “poderosos” presos. Vir agora falar disso, e com a insistência com que Jorge Sampaio o faz parece mal e dá para desconfiar.
O cidadão Jorge Sampaio partilhou o escritório de advocacia com dois ex-ministros socialistas da Justiça: Vera Jardim e António Costa. Nesses tempos, manteve-se calado enquanto o anterior Procurador-geral da República concentrava poderes e somava polémicas.
O Presidente da República esteve calado durante todos os dias em que cidadãos comuns foram vítimas da mesma Justiça que agora está tão na ordem do dia: os advogados eram os mesmos, os juízes idem, os investigadores idem idem.
Parece mal, parece-me muito mal, que o Presidente da República tenha começado a falar quando foi detido alguém da sua família política. Também por isso, Jorge Sampaio devia ser mais, digamos, prudente.
Não porque as razões não sejam boas. Desconfio que são, até, muito boas. Mas, insisto, esta Justiça existe assim há muitos anos e de Sampaio não se ouviu uma palavra. Agora parece mal.
Já agora, de Jorge Sampaio - e sobre este mesmo tema - esperar-se-ia uma tomada de posição de alerta contra a mais recente proposta do bastonário da Ordem dos Advogados: Júdice defendeu publica e implicitamente o reforço dos poderes da Judiciária e do Ministério Público.
Iremos de mal a pior e, aqui, sim, era desejável uma palavra, uma frase, um discurso, do Presidente da República.

sexta-feira, outubro 03, 2003

Coincidências
Ele há coisas curiosas...
No mesmo dia em que o ministro do Ensino Superior até tinha um episódio que poderia capitalizar a seu favor, cai estrondosamente devido a uma trapalhada inacreditável (e inaceitável, já agora...)
Vejamos por partes:
1. O ministro, a filha do ministro e a universidade
A filha do ministro dos Negócios Estrangeiros resolveu escrever ao colega do pai, pedindo-lhe um regime de excepção para poder entrar numa qualquer faculdade de ciências médicas. O ministro, certamente desconhecendo de quem se tratava, subscreveu o parecer do seu director-geral (ou lá o que é) e autorizou. Acontece que não há despachos ou portarias que contrariem leis ou decretos-lei. A coisa soube-se e, pum!, acabou um dos poucos Lynces de que havia notícia em Portugal.
2. A praxe no seu melhor
Onze (11) estudantes do ensino superior foram detidos em Oeiras devido a um arremedo de assalto a uma dependência bancária. Ao que parece, era a praxe. Se percebi, uns quaisquer veteranos mandaram os indefesos jovens simular um assalto à Caixa Geral de Depósitos. Tá certo! O que é preciso é imaginação: com o povo farto das palermices do costume, nada melhor que inventar novos caminhos para "integrar" os caloiros no "espírito". Se todos eles (mandantes e mandados) não forem expulsos do ensino superior, será que alguém continua a acreditar que as "instituições" funcionam?