domingo, março 27, 2005

Sobre o litoral

O “Público” de hoje, domingo de Páscoa, ‘descobriu’ que o mar está crescentemente a ameaçar a nossa costa – do Minho ao Algarve (melhor dizendo, de Espanha a Espanha) – e que, desde 1971, nada se fez verdadeiramente para estancar as ameaças.
Pois não! Mas queriam o quê? Medidas radicais num país de patos bravos? Verdade seja dita, o “Público” refere UM caso – entre 1986 e 1989 –, embora não faça justiça ao autor: Carlos Alberto Martins Pimenta, por acaso meu amigo e correligionário dos ‘velhos tempos’, o único governante que teve coragem e, por isso, andou guardado à vista e com poiso errante…
Lembro-me bem desse tempo: lembro-me do que era, por exemplo, a Polvoeira (ali no concelho de Alcobaça), dos insultos que ficaram nas poucas paredes da ‘paisagem lunar’ que restou depois das demolições.
Mas foi, de facto, caso único. Antes e depois, é um fartar vilanagem que comprova quem de facto manda em Portugal: uma propositada indefinição que permite, assim, que cada um faça o que quer, com ou sem necessidade de suborno ou tráfico de influências.
O “Público” escreve o que já escrevi, há uns anos, no “Jornal de Leiria”, num dos trabalhos que mais gozo me deu fazer: uma das ‘culpas’ é das barragens: o défice anual de deposição de inertes no mar é fantástico!
No que ao litoral da região de Leiria diz respeito, a culpa (sem aspas) é também da megalomania da Figueira da Foz e Coimbra, que quiseram transformar o portozinho da Figueira num portozão. Vai daí, toca de prolongar os pontões da foz do Mondego e de aprofundar o leito, chegando-se ao cúmulo de exportar areia para Espanha. É bom dizer que para este desastre que se anuncia também contribuiu o facto de a administração do porto arrecadar o dinheiro da venda da areia.
Por tudo isto, percebe-se a dificuldade de intervir: são muitos interesses, muito poderosos… Só com grande força e coragem políticas será possível.
Porque é preciso mexer com a máquina do Estado, acabando com as quintinhas e dando o poder a uma única entidade. Porque é preciso demolir tudo o que é ilegal, afrontando pequenos, médios e grandes interesses.
Mas são precisas força e coragem políticas para ir ainda mais longe: porque é preciso ‘entrar’ pela propriedade privada e deitar abaixo aquilo que esteja directamente ameaçado e seja mais caro proteger que demolir. Sem hesitações!
Se eu, e todos nós, vamos ter que pagar para proteger o litoral, então que paguemos para proteger o que é de fruição comum e não os egoísmos de uns quantos, que nos anos recentes souberam jogar com as indefinições legais.
Depois, então, será preciso proteger o que só foi colocado em risco por erros a montante.

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