sexta-feira, agosto 01, 2003

Uma democracia que não é a minha
Nove (9!) senhores generais do exército português reuniram-se ontem ao jantar. Oito deles, se não me engano, estão na reserva (ou na reforma), o que os transforma, pelo menos em tempo de paz, em vulgares cidadãos como eu ou qualquer de vós que me leia.
Nove generais sentaram-se à mesa de um restaurante para ouvir de um deles as razões de queixa relativamente ao poder político. Nós até sabemos o fundamental: aquele único que está no activo perdeu a confiança no seu chefe - caso notável, este de um subordinado perder a confiança em quem manda nele...
Nove generais que invocaram a democracia para se juntarem. Nove generais que ousaram desafiar a democracia, contestando - corporativamente - quem tem uma legitimidade que resulta do voto popular.
Recuemos mais alguns dias. Não sei se nove - talvez mais, talvez menos - notáveis civis reuniram-se - quiçá ao jantar... - e assinaram um texto em que, em nome da democracia, pedem nem sei bem o quê relativamente à nossa Justiça. Entre estes notáveis contam-se não sei quantos deputados e ex-deputados, um ex-Presidente da República (que também foi deputado e primeiro-ministro e é deputado europeu), um candidato derrotado à Presidência da República (que também foi deputado, vice-primeiro-ministro e, até, presidente da Assembleia Geral da ONU).
Algo me separa profundamente de todos estes senhores e senhoras. Algo que ultrapassa divergências ideológicas e diferenças de análise conjuntural.
Tal como eles (todos?) não gosto de Paulo Portas. Tal como eles (todos?) desconfio de Durão Barroso e do conjunto de nulidades que o rodeiam.
Onde os nossos caminhos se separam é logo ali a seguir.
Porque eu, não gostando particularmente deste governo, respeito o voto popular e sei que tenho que esperar pelas próximas eleições para "dizer" o que penso. Seja da tropa, da justiça, das gravatas dos senhores ou dos lenços das senhoras.
Eles, pelo contrário, estão convencidos que o povo foi cacicado ou se enganou. E não admitem que quem detém o poder não sejam os seus amigos. Eles pensam a democracia como um instrumento ao seu serviço, dos amigos e dos interesses. Eles não admitem que o seu tempo está a passar (ou já passou). Eles esquecem que, para o bem ou para o mal, quem hoje ocupa o poder são os filhos deles: se são maus... é porque foram formados assim!
Para acabar com quem comecei. O problema dos tropas (do exército em particular) é que quiseram acabar com a guerra colonial e manter as mordomias. Mas o dinheiro não chega para sustentar tantos generais e outros oficiais superiores, mais os inferiores, os sargentos, os praças e a modernização do material. Eles não querem perceber que é mais importante um fontanário de aldeia que uma bala e que o dinheiro que gastamos para eles preguiçarem nas paradas dos quartéis era mais bem empregue no reforço da vigilância das florestas, por exemplo!

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